Doing Business in Brazil

1.2. Estrutura Jurídica Brasileira

22/07/20

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE O SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO

O sistema jurídico brasileiro tem como principal fonte normativa a Constituição Federal de 1988, que determina os fundamentos e objetivos fundamentais da república, apresenta um extenso rol de direitos e garantias fundamentais, arrola direitos sociais, enuncia diversos princípios a serem aplicados pelos criadores e aplicadores das leis e delimita os poderes do Estado. Além disso, diferentemente das constituições da maioria dos países, a Constituição brasileira traz os delineamentos gerais de diversas áreas, chegando, em alguns casos, a estabelecer regras bastante detalhadas, como é o caso do sistema tributário nacional e do sistema orçamentário.

No campo da delimitação dos poderes do Estado, a Constituição adota um modelo federativo, ao organizar político-administrativamente a república pela divisão do poder entre União Federal, estados, Distrito Federal e Municípios, todos autônomos e com competências delimitadas no próprio texto constitucional (em alguns casos, com competências concorrentes, ou seja, com a determinação de matérias passíveis de regulação por mais de uma esfera). A divisão da república na forma federativa tem uma relevância enorme, uma vez que a federação brasileira não poderá ser abolida sequer por uma emenda à constituição (ou seja, é uma das chamadas cláusulas pétreas).

Além da organização político-administrativa, adotando um modelo de tripartição de poderes amplamente difundido globalmente, a Constituição Federal divide as funções do Estado entre os poderes executivo, legislativo e judiciário, cada qual com suas atribuições específicas. União, estados e Distrito Federal são dotados de executivo, legislativo e judiciários próprios, ao passo que os Municípios apenas de poderes executivo e legislativo locais (as questões judiciais são tratadas nos poderes vinculados aos estados ou à União, dependendo da matéria).

Além dos três poderes citados, o Ministério Público figura como entidade extremamente relevante no Estado brasileiro, na medida em que sua atuação é essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, razão pela qual alguns o identificam como um quarto poder.

Tal como ocorre em outros países optantes pelo regime de separação de poderes, as funções administrativas são de competência do poder executivo, cuja atuação deve sempre observar as competências delineadas na Constituição Federal e nas leis. Tais limitações resultam do princípio da estrita legalidade, segundo o qual a administração pública apenas pode agir segundo a lei, embora existam exceções, como é o caso de matérias nas quais a própria lei (ou Constituição) permite certa flexibilidade nas ações dos mandatários públicos, o que se costuma denominar de “discricionariedade”. Além disso, destaca-se a atuação das agências reguladoras para alguns setores da economia nos quais a fiscalização do Estado deva ser mais contundente, a exemplo da Agência Nacional de Petróleo e Gás e da Agência de Vigilância Sanitária, bem como das autarquias fiscalizadoras da atuação econômica, a exemplo da Receita Federal, Banco Central e Comissão de Valores Mobiliários, autoridades estas destinadas a criar regras específicas, baseadas nos poderes a elas outorgas por lei, e supervisionar a conformidade das atividades executadas pelos particulares, de forma a garantir os preceitos constitucionais relacionados à ordem econômica e operação e desenvolvimento da economia brasileira à luz das regras da Constituição de 1988.

No mais, à exceção da criação de medidas provisórias, que apenas podem ser adotadas pelo Presidente da República em caso de relevância e urgência e dentro dos limites e matérias arrolados na Constituição Federal, é vedado ao poder executivo, no Brasil, criar regras que inovem no ordenamento jurídico (criem, alterem ou retirem direitos positivados no sistema legislativo), sobretudo nos casos em que já houver lei em sentido contrário. Ademais, mesmo as medidas provisórias devem ser objeto de deliberação do parlamento, que poderá ou não as aprovar, o que realça a necessidade de sempre haver intervenção parlamentar para a criação de novas regras jurídicas no Brasil.

Já ao poder legislativo toca a função de criação das leis, de acordo com as matérias, limites e procedimentos previstos nas constituições da república e dos estados e nas leis orgânicas dos municípios. Vale lembrar que algumas matérias submetidas à deliberação do poder legislativo são de iniciativa exclusiva do poder executivo, tal como é o caso das leis orçamentárias, instrumentos importantíssimos de gestão pública no sistema jurídico brasileiro. Embora algumas matérias sejam de iniciativa exclusiva do executivo, nada impede que os legislativos alterem o teor das propostas que lhe são apresentadas, na medida em que o regime democrático exige sempre a intervenção do parlamento na aprovação das leis brasileiras.

Por fim, o poder judiciário exerce o papel de julgar os conflitos entre os cidadãos, empresas e ou poder público, de forma a aplicar a constituição e a lei aos casos concretos e, assim, dirimir os conflitos que lhe são apresentados. Além disso, alguns tribunais têm a competência de decidir questões abstratas de constitucionalidade, tais como são os casos do Supremo Tribunal Federal (STF), que tem competência para julgar a constitucionalidade de leis federais e estaduais, e os Tribunais de Justiça dos estados, que julgam as ações que tenham por objeto as leis municipais. No caso do STF, as decisões proferidas em ações diretas de inconstitucionalidade (ADINs), bem como declaratórias de constitucionalidade (ADCs), são vinculantes e aplicáveis a todos (o chamado efeito erga omnes), inclusive ao poder público.

Embora originalmente forjado com forte influência do sistema de civil law, uma vez que baseado na produção normativa exclusivamente de fonte legislativa, o sistema jurídico brasileiro tem-se aberto a algumas características tradicionalmente relacionadas à common law. Isso porque, nos últimos anos, algumas alterações das leis processuais e da própria Constituição têm dado maior eficácia a algumas decisões judiciais proferidas pelos tribunais superiores (STF e Superior Tribunal de Justiça) para além daquelas proferidas em sede de controle concentrado de constitucionalidade (as já citadas ADIns e ADC), tornando-as, com isso, também vinculantes e dotadas de efeito erga omnes ainda que tenham por objeto casos concretos decididos em processos com partes específicas. É o caso das decisões proferidas com repercussão geral, no caso do STF, e no rito dos recursos repetitivos, no caso do STJ. Também as súmulas do STF se tornaram vinculantes, tendo efeito semelhante aos das leis sob o ponto de vista pragmático.


Autores:

Maurício Barros

Sócio de Gaia Silva Gaede & Associados em São Paulo, Doutor em Direito Econômico, Financeiro e Tributário pela USP, Mestre em Direito Tributário pela PUC/SP, Especialista em Direito Tributário pelo IBET, Advogado formado pela PUC/SP, Juiz Contribuinte do Tribunal de Impostos e Taxas do Estado de São Paulo (TIT/SP), Coordenador do Núcleo Tributário do Comitê Jurídico da Câmara Ítalo-Brasileira de Comércio, Indústria e Agricultura (ITALCAM), Membro do grupo de pesquisa “Tributação e Novas Tecnologias” da Direito FGV/SP.

Sahelê Felicio

Advogado associado de Gaia Silva Gaede & Associados, graduado pela Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie, com pós graduação em Direito dos Contratos (LLM) pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (INSPER). 

 

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