Doing Business in Brazil

1.1. Destaques do Brasil

03/07/23

Brasil em retrospectiva
O ano de 2023 encerrou um ciclo de grandes adversidades para economia brasileira. A começar pelos acontecimentos de âmbito internacional, a guerra Russo-Ucraniana a qual  elevou drasticamente os preços de energia (ainda que de forma temporária), o aumento das tensões entre China e Taiwan impactou (e ainda impacta) toda a cadeia de semi-condutores, inflação alta e aperto monetário global mudaram direcionamento de capital para economias desenvolvidas e pressionam lucratividade de empresas (principalmente as bigtechs), entre outros fatores.

No âmbito nacional, todos estes fatores internacionais pressionaram igualmente os indicadores macroeconômicos, gerando uma necessidade de correção adicional de juros para combate à importação de inflação dos preços de energia e dos alimentos. Ainda assim, mesmo com as adversidades alóctones e algum estresse derivado da polarizada eleição, a trajetória de investimentos em infraestrutura realizada nos anos anteriores somada aos incentivos diretos do pacote para estímulos à economia no período de pandemia mantiveram o ritmo de retomada do mercado de trabalho, com aumento evidente de postos de trabalho, tanto formais como informais. Dito de outra forma, apesar de todos os empecilhos globais e internos, a massa salarial retomou níveis pré-pandêmicos, movimentando o consumo das famílias e investimentos, principais condutores da ótica da demanda do PIB.

Ambiente de negócios
Até a metade deste ano, o impasse político criado pelas exigências do Legislativo minou diversas diretrizes estabelecidas até então pelo novo governo. A falta de liderança do Executivo e as diversas guerras internas dentro da aliança governista chancelam esta evidência.

Ainda assim, os novos marcos regulatórios recentemente criados1, deixaram um legado positivo para os números de investimento, definitivamente mais animador em relação às transições eleitorais passadas. Em termos microeconômicos, o governo Federal ainda contou com outros avanços relevantes, como o desenvolvimento e promoção de novas metodologias referenciais de avaliação ex-ante e ex-post de projetos de infraestrutura, além da contabilização (agora) centralizada do Monitor de Investimentos. Outros marcos, tais  como a operação de desestatização da Eletrobrás – e sua aprovação de lei específica – e aprovação e uso de ferramentas de planejamento integrado, como a instituição do PILPI, o Plano Integrado de Longo Prazo da Infraestrutura 2021-2050, também podem ser consideradas importantes para o ambiente institucional do país.

Uma das evidências da melhoria nesse novo ambiente foi o ritmo de leilões firmado nos anos anteriores, mesmo com o advento da crise do COVID-19 e, mais recentemente, da paralisia governista do governo federal atual.

Fundamentos macroeconômicos
O chamado efeito “rebote” do ambiente macroeconômico externo começa a se materializar. Após um ano ruim em diversas economias desenvolvidas, o arrefecimento de inflação, resultados predominantemente positivos no mercado de trabalho mundial, estabilização dos efeitos da COVID19 (e consequente estanque da quebra da cadeia de suprimentos mundial) e pausa do ciclo altista de juros nos EUA, por exemplo, são alguns dos fatores que motivam uma melhoria para os fatores internos no Brasil.

Adicionalmente a estes fatores, a revisão para cima na perspectiva para a nota soberana do Brasil pela S&P aumentou o otimismo dos investidores com relação aos ativos brasileiros. Três fatos favorecem esta linha de raciocínio: 1) o contrato futuro de taxa de juros com vencimento em Jan27 caiu de 11,65% para 10,53% entre 09/05 e 16/06 2) a taxa de câmbio caiu a 4,82 BRL por USD em 16/06, com valorização acumulada no ano de cerca de 8% e; 3) o Ibovespa retomou o patamar próximo de 120 mil pontos, com valorização no ano em torno de 8,3%.

Internamente, a desinflação já é realidade e ocorre conjuntamente com uma melhoria da atividade econômica economia de outro. Por exemplo, o IPCA cheio em 12 meses passou de 4,18% para 3,94% entre Abr23 e Mai23, ainda sob o efeito das deflações mensais de Jul22 a Set22. O núcleo do IPCA (itens menos voláteis) diminuiu de 7,32% para 6,73%, o menor nível desde Set21. Se medido pelo IGP-M no período, vemos deflação: 1,84% em Mai23, resultando na deflação histórica de 4,46% em 12 meses.

Esta boa notícia de curto prazo, contudo, pode ser um problema se mantido, uma vez que maior atividade econômica e aumento do endividamento público atiçam a inflação e tendem a prolongar o período necessário para que a inflação desacelere para o nível desejado. Paralelamente, a queda nos preços das commodities pode ser um bom fator de melhoria dos preços “importados”, mas este efeito ainda é incerto, já que diversas outras commodities ainda seguem em níveis bastante elevados.

Concernente à atividade econômica, a alta do PIB (de 1,9% no PIB do 1tri23) surpreendeu previsões de mercado. Ainda assim, é difícil fazer um prognóstico mais assertivo sobre os próximos períodos, uma vez que há um clima misto de surpresas positivas e negativas. Em abril, a produção industrial, por exemplo, caiu 0,6%, enquanto o varejo ampliado (inclui todos os setores do varejo mais venda de veículos, autopeças e produtos da construção civil) cedeu 1,6%. Já o indicador coincidente do PIB medido pelo Banco Central, o IBC-Br, mostrou alta de 0,56% no mês, possivelmente devido aos efeitos do agronegócio e atividades de exportação, uma vez que a economia mundial segue, por ora mais pujante.

Brasil em perspectiva
Internacionalmente, o conflito Rússia-Ucrânia e possibilidade de uma recessão mundial seguem como as preocupações para influência do andamento da economia brasileira. Enquanto a sangria do conflito parece ter sido razoavelmente estancada (principalmente os efeitos em preços de energia e outros importantes itens de consumo importados aqui, como trigo), a possibilidade de recessão ainda segue afrontando as principais economias, principalmente europeia, dependente de uma grande fatia de energia oriunda da Rússia.

Internamente, o processo de desinflação no Brasil segue refletindo os efeitos das oscilações nos preços dos alimentos e combustíveis. A consolidação dos preços das commodities em nível abaixo da média de 2022 e a valorização do real permitirão a manutenção do quadro de deflação nos preços no atacado e que deve ser repassado parcialmente ao consumidor ao longo dos próximos meses, sustentando a desinflação nos preços dos bens. O IPCA no fim de 2023 tende a situar-se em torno de 5,5%.

É provável que o BC inicie um ciclo de queda gradual da taxa Selic a partir de Ago23. A recente queda observada nas expectativas de inflação deve seguir pelas próximas semanas e tende a gerar segurança para esta mudança na direção da taxa de juros. Dentre os riscos para eventual postergação no início do ciclo de queda estão a versão final das regras do arcabouço fiscal, revisão da meta de inflação nas próximas reuniões do CMN e a velada declaração de intenção do governo em expandir o crédito via bancos públicos. Adicionalmente, outro risco, político, a ser considerado nos próximos meses é o desejo governamental de revisar a lei de independência do BC.

A surpresa positiva com o PIB do 1tri23 e com o indicador de atividade econômica IBC-Br de Abr23 reforçaram a percepção de resiliência da economia e alimentaram rodadas de revisões para cima nas projeções de crescimento do PIB em 2023, atualmente no intervalo entre 1,6% e 2,8%, segundo levantamento da Agência Estado com analistas econômicos. Apesar da desaceleração no ritmo de crescimento das atividades de serviços entre Jan23 e Abr23, ainda segue compatível com um crescimento entre 1,5% e 2% em 2023. O desempenho positivo da economia tem sustentado o mercado de trabalho e, associada à desinflação e aos programas de assistência do governo, sugere que o consumo doméstico pode permanecer robusto.

As incertezas relacionadas ao ambiente de negócios limitam o otimismo com relação ao investimento em capital fixo, embora parcela importante no setor de infraestrutura já esteja “contratada”. Contudo, a queda observada nas taxas de juros no mercado futuro, especialmente nos vencimentos mais longos, pode fomentar gradual recuperação no investimento, ainda que isso aconteça com mais evidência no 2sem23. Por fim, as revisões nos orçamentos a partir de uma expectativa melhor para o PIB do ano e para as condições de juros e inflação também representam ambiente menos desafiador para o plano de investimento das empresas.

Para as finanças públicas, embora o arcabouço fiscal represente expansão real do gasto público, e consequente aumento da carga tributária, o mercado financeiro tem sinalizado simpatia com o projeto aprovado no Senado (será revisitado pela Câmara) e sua contribuição para conter o aumento descontrolado do endividamento público no curto prazo.

Com relação ao câmbio, o dólar tende a perder força em relação às principais moedas com a pausa no ciclo de alta da taxa de juros nos EUA. Nesse ambiente, os fundamentos do setor externo do país (elevado superávit comercial e retomada no fluxo do investimento estrangeiro ao país) e o elevado diferencial de juros, mesmo sob um ciclo de queda na taxa Selic, justificariam alguma valorização do BRL no horizonte de 12 meses. No entanto, a crescente incerteza gerada pelo governo (arcabouço fiscal que privilegia expansão real do gasto público e pressiona a carga tributária, intenção de alterar a meta de inflação e a intenção de revisar as reformas estruturais) é um ponto de atenção e que pode manter os investidores cautelosos. No médio prazo, a expectativa é de um BRL relativamente depreciado.

Politicamente, há em curso 2 projetos preferenciais declarados pelo governo: a reforma tributária e a revisão de leis de austeridade fiscal/econômica dos governos Temer-Bolsonaro. Enquanto a reforma tributária pleiteia principalmente uma mudança substancial da correção da tabela do Imposto de Renda e unificação de tributos estaduais e municipais, a forma como isso será ocorrerá ainda é incerta e já gera desavenças fundamentais para consecução de seu apoio político. Com relação à revisão das leis de austeridade fiscal/econômica, colocar-se-ão à prova os fundamentos da reforma trabalhista, lei das estatais, lei do saneamento, marco das ferrovias, independência do Bacen (além da meta de inflação), TLP e BNDES, Lei das S/As, dentre outras.

Conclusões 
Por ora, os efeitos internacionais para economia brasileira mostram-se controlados. Internamente, um cenário melhor do que o esperado se erige: inflação em patamares próximos à meta, taxa de juros com perspectiva de queda, aumento de emprego e renda, câmbio controlado, entre outros fatores devem continuar impulsionando a economia.

A atividade econômica seguirá em grande parte lastreada pelos bons frutos do agronegócio, uma vez que nova safra recorde deverá ser registrada este ano. Por usa vez, a injeção de renda e crédito devem aumentar o consumo, impactando positivamente o setor de serviços e varejo. A indústria, porém, segue em baixa, tentando conseguir em grande parte de seus esforços subsídios ou queda de juros para seu financiamento.

No plano político, contudo, ainda se mantém um clima de incertezas muito grande, já que até o momento, o governo federal não viabilizou nenhuma das mudanças propostas em campanha, perdeu grandes disputas políticas, como mostrou o caso da reversão do posicionamento dos decretos de saneamento, ou mesmo dos acontecimentos recentes de embate entre Congresso e Executivo e das propostas que ainda seguem com apoio político e institucional, o desdobramento tende a tirar efeitos de produtividade para economia.


1. Para lembrar, conforme elencado pelo último relatório do Projeto Infra 2038, nos últimos quatro anos criaram-se a Lei das Agências, Lei de Liberdade Econômica, Lei de Ambiente de Negócios, Novo Marco de Telecomunicações, Desoneração de IoT, Aperfeiçoamento do Leilão do 5G, Norma sobre Antenas , Lei do Novo Regime de Outorga de Ferrovias, BR do Mar ou Lei da Cabotagem, Lei de Liberalização do Setor Aéreo , Lei do Gás, Lei de Venda Direta do Produtor de Etanol, a lei pró-consumidor do Setor Elétrico e a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, além de diversas iniciativas infralegais e regulatórias.


Autor: Frederico Turolla e Yan Cattani

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