A Governança Corporativa no Brasil avançou de forma expressiva nas últimas décadas, acompanhando a maior integração do país à economia global e o aumento das exigências internacionais por transparência, integridade e responsabilidade na administração das empresas. Para investidores estrangeiros, compreender essa estrutura é fundamental para avaliar riscos, assegurar conformidade e identificar oportunidades.
1. Visão Geral
Governança Corporativa no Brasil refere-se ao sistema que orienta, monitora e incentiva empresas, envolvendo sócios, administradores, conselhos, órgãos de fiscalização e demais stakeholders. Seu objetivo central é preservar e gerar valor de longo prazo, reduzir riscos e garantir padrões éticos elevados.
O tema ganhou força no país a partir dos anos 1990, especialmente com a criação do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), cuja atuação segue referências internacionais como os princípios da OCDE e do G20.
2. Princípios Fundamentais
O modelo brasileiro se baseia em quatro princípios amplamente reconhecidos pelo mercado global:
- Transparência – Divulgação tempestiva e completa de informações relevantes.
- Equidade – Tratamento justo e isonômico, especialmente para acionistas minoritários.
- Responsabilidade Corporativa – Integração de fatores ambientais, sociais e de sustentabilidade.
- Prestação de Contas (Accountability) – Responsabilidade dos administradores por decisões e resultados.
Esses pilares hoje se estendem além da gestão societária, influenciando áreas como riscos, compliance, tecnologia e canais de ética.
3. Estrutura Regulatória Brasileira
O Brasil possui um arcabouço jurídico sólido, composto principalmente por:
- Lei das S.A. (Lei nº 6.404/1976) – Estabelece direitos dos acionistas, regras de transparência e obrigações de divulgação.
- Comissão de Valores Mobiliários (CVM) – Regula o mercado de capitais, assegurando a proteção ao investidor e padrões elevados de governança.
- IBGC – Principal referência nacional de boas práticas e códigos de governança.
O aperfeiçoamento do marco regulatório — em especial o fortalecimento da CVM, a atualização da Lei das S.A. e a adoção de padrões internacionais como a ISO 37000 — oferece maior previsibilidade e proteção ao capital.
Para investidores estrangeiros, isso significa redução de riscos legais, maior confiança no cumprimento de obrigações de disclosure e um ambiente propício à avaliação precisa de ativos.
4. Estrutura de Governança nas Empresas
Para garantir freios e contrapesos adequados, é comum que organizações mantenham:
- Assembleia Geral
- Conselho de Administração
- Conselho Fiscal
- Diretoria Executiva
- Comitês de assessoramento (Auditoria, Riscos, Pessoas, Sustentabilidade etc.)
- Secretaria de Governança
Essa arquitetura assegura decisões mais independentes, controles mais rigorosos e maior transparência.
5. Governança e Planejamento Estratégico
As empresas brasileiras vêm adotando modelos que incluem:
- Avaliação de riscos integrada
- Mapeamento de lacunas de governança
- Métricas quantitativas e análises qualitativas
- Criação de agendas de governança de curto, médio e longo prazo
Tais práticas reforçam a sustentabilidade, a eficiência e a credibilidade corporativa.
6. Iniciativas Relevantes do IBGC
A agenda atual de boas práticas inclui temas prioritários como:
- Ética e integridade
- Diversidade e inclusão
- Impactos ambientais e sociais
- Inovação
- Transparência e diálogo com stakeholders
- Conselhos mais diversos e preparados para transformação digital
A diversificação e o fortalecimento dos Conselhos de Administração — impulsionados pelo IBGC e por pressões de investidores — geram:
- Processos decisórios mais técnicos e imparciais;
- Estratégias corporativas mais sólidas;
- Maior resiliência em momentos de instabilidade.
Para investidores estrangeiros, isso representa melhor governança estratégica, com impacto direto na valorização de longo prazo.
7. Normas Internacionais Aplicáveis (ABNT ISO 37000:2022)
O Brasil adota padrões globais de governança que reforçam:
- Propósito organizacional
- Criação sustentável de valor
- Supervisão efetiva
- Engajamento das partes interessadas
- Gestão de riscos
- Responsabilidade social e visão de longo prazo.
8. Segmentos de Governança na B3
A Bolsa brasileira oferece segmentos especiais que exigem práticas superiores:
- Novo Mercado
- Nível 1
- Nível 2
A adesão crescente de companhias brasileiras aos segmentos diferenciados da B3 indica maior maturidade de governança. Essas empresas apresentam:
- Conselhos mais independentes;
- Elevados padrões de transparência;
- Mecanismos robustos de controles internos e compliance;
- Proteção reforçada a acionistas minoritários.
Esse movimento amplia as oportunidades de investimentos em empresas com governança comparável a mercados desenvolvidos.
9. Avanço da Agenda ESG
O Brasil possui vantagens competitivas naturais e regulatórias no campo ESG, especialmente nas áreas ambiental e social. O amadurecimento de práticas de responsabilidade corporativa gera oportunidades em:
- Energias renováveis;
- Agronegócio sustentável;
- Infraestrutura de baixo impacto;
- Tecnologia limpa;
- Projetos de biodiversidade e créditos de carbono.
Investidores estrangeiros que priorizam ESG encontram no Brasil um mercado amplo, em transformação e com crescente demanda por capital verde.
10. Maturidade em Gestão de Riscos e Compliance
A integração cada vez maior entre Governança, Gestão de Riscos e Compliance fortalece a confiança no ambiente corporativo brasileiro. Essa estrutura reduz riscos de:
- Fraudes e corrupção,
- Inconsistências contábeis,
- Instabilidades operacionais.
Com empresas adotando controles mais rigorosos e sistemas de integridade, abre-se espaço para investimentos mais arrojados e para o ingresso de fundos institucionais com requisitos elevados de conformidade.
11. Tendências e Oportunidades
a) Expansão de Setores Estratégicos
O ambiente de governança cria condições favoráveis para investimentos em setores que exigem alto grau de compliance, como:
- Mercado de capitais;
- Bancos e fintechs;
- Infraestrutura e logística;
- Energia;
- Saúde;
- Tecnologia e inovação.
Esses setores, historicamente sujeitos a rigor regulatório, tornam-se ainda mais atrativos com o aumento da transparência e da segurança institucional.
b) Crescimento do Mercado de Capitais
A evolução da governança impulsiona:
- Aberturas de capital (IPOs);
- Emissões de dívidas;
- Expansão de fundos de investimento e private equity;
- Desenvolvimento do mercado de capitais local.
Para investidores estrangeiros, isso amplia a disponibilidade de ativos, diversifica opções de portfólio e amplia canais de entrada no mercado brasileiro.
c) Ambiente Favorável para Parcerias Estratégicas e M&A
Com empresas mais estruturadas em governança, cresce a possibilidade de:
- Joint ventures com maior segurança;
- Operações de fusões e aquisições mais transparentes;
- Due diligence mais clara e baseada em dados confiáveis.
Isso reduz assimetrias de informação e facilita operações cross-border.
d) Potencial de Valorização em Mercados Emergentes
O Brasil, como maior economia da América Latina, combina:
- Amplo mercado consumidor;
- Estabilidade institucional crescente;
- Políticas de governança em linha com padrões internacionais.
O investidor estrangeiro encontra um ambiente emergente com potencial de valorização acima da média, mas com riscos mitigados por estruturas modernas de governança.
12. Considerações Finais
A Governança Corporativa consolidou-se como um dos pilares essenciais para o fortalecimento do ambiente de negócios no Brasil. Nas últimas décadas, avanços significativos no marco regulatório, na atuação de órgãos supervisores e na adoção de práticas alinhadas a padrões internacionais elevaram o nível de transparência, integridade e eficiência das organizações brasileiras.
A crescente profissionalização dos Conselhos de Administração, a integração entre governança, riscos e compliance, e a ampliação da agenda ESG demonstram que o país está em um processo contínuo de amadurecimento institucional. Esses elementos reduzem assimetrias de informação, mitigam riscos e ampliam a confiança de investidores, nacionais e estrangeiros, na capacidade das empresas de gerar valor sustentável no longo prazo.
Embora desafios permaneçam — especialmente no que se refere à consolidação de culturas organizacionais éticas e à estabilidade política e econômica — o Brasil apresenta hoje um ambiente corporativo mais moderno, previsível e competitivo. Nesse contexto, a governança deixa de ser apenas um requisito regulatório e passa a ser um diferencial estratégico.
Assim, o fortalecimento contínuo das práticas de governança corporativa tende a posicionar o país em patamar cada vez mais favorável no cenário global, ampliando oportunidades de investimento e contribuindo para o desenvolvimento econômico sustentável.
Autora: Renata Assalim Fernandes Souza
Head das Áreas de Contratos, Compliance e Propriedade Intelectual do escritório De Vivo, Castro, Cunha e Whitaker Advogados.
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