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4.5. Direitos Autorais

23/08/24

4.5. DOS DIREITOS AUTORAIS E SUAS FORMAS DE PROTEÇÃO

4.5.1. Introdução

É fato incontroverso que o Direito Autoral está presente no cotidiano das pessoas, ainda que nem todos tenham clareza disso. Explicamos: quando tiramos uma selfie, fazemos um vídeo no smartphone ou produzimos um texto ou um desenho para uma página na Internet, produzimos uma obra intelectual. Além disso, fazemos uso de obras e conteúdos protegidos por Direitos de Autor e direitos conexos quando lemos um livro, assistimos a uma peça de teatro ou a um filme, ouvimos uma música ou usamos um software de computador.

Em razão da proteção dos Direitos Autorais, uma premissa importante é de que nem todo conteúdo que está disponível, seja em suporte físico ou nos meios digitais, pode ser utilizado de forma indiscriminada, pois a proteção autoral independe do meio em que esse conteúdo tenha sido criado ou do suporte sobre o qual ele tenha sido gravado.

Nesse sentido, assim como ocorre em outros países, para se fazer uso de uma obra autoral no Brasil é necessário – com exceção de alguns casos, conforme veremos a seguir – haver autorização do titular da obra sob pena de se incorrer em ilícito civil e/ou criminal.

Este capítulo tem por objetivo apresentar ao empresário, que pretende investir no Brasil, um breve panorama acerca da regulação dos Direitos Autorais no País, trazendo, por exemplo, o que a lei considera passível de proteção, o que não goza de proteção legal e as consequências aplicadas em caso de violação de Direitos Autorais, sem, contudo, esgotar o tema que é muito vasto.

4.5.2. Panorama geral sobre os Direitos Autorais

Existem dois sistemas de proteção dos Direitos Autorais: (i) o copyright, dos países em que o direito tem origem anglo-saxã, fundado na justificação utilitária e nas considerações econômicas; e (ii) o droit d’auteur, oriundo do direito francês, adotado no Brasil, e se desmembra em direito patrimonial e direito moral, conforme será visto a diante.

Os Direitos Autorais no Brasil são regidos pela Constituição Federal de 1988 (artigo 5º, incisos XXVII e XXVIII), pela Lei Federal nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998 (“Lei do Software”), que dispõe sobre a propriedade intelectual do programa de computador, pela Lei Federal nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 (“Lei de Direitos Autorais”), que regula de forma geral a proteção dos Direitos Autorais, além de outras normas específicas a depender do assunto.

Nos termos da Lei de Direitos Autorais, o criador da obra intelectual tem assegurada a proteção dos seus Direitos Morais e Patrimoniais. Vejamos cada um deles:

  1. Direitos Patrimoniais: dizem respeito à capacidade de exploração econômica pelo autor; ou seja, assegura ao titular o direito de obter um benefício financeiro em contrapartida da utilização da sua obra por terceiros. Os Direitos Patrimoniais estão estritamente ligados ao uso, fruição e exploração da obra, sendo certo que, nesse contexto, o autor tem a prerrogativa de ceder o seu uso de forma definitiva ou temporária, mediante licenciamento. Nesse diapasão, os Direitos Autorais Patrimoniais são transferíveis desde que observadas as limitações previstas no artigo 49 da Lei de Direitos Autorais, dentre elas a da expressa previsão contratual; e
  2. Direitos Morais: decorrem da criação de espírito e estão vinculados à personalidade do autor. Desta forma, possuem caráter personalíssimo, perpétuo, inalienável, indisponível e impenhorável. Os Direitos Morais do autor estão elencados no artigo 24 da Lei de Direitos Autorais e incluem, entre outras hipóteses, o direito de reivindicar a autoria da obra a qualquer tempo e o de ter seu nome indicado ou anunciado como sendo o do autor, na utilização da obra.

 

Os Direitos Patrimoniais, diferentemente dos Direitos Morais, não vigoram de forma perpétua. Assim, findo o prazo estipulado na Lei, a obra entra em domínio público e seu uso passa a ser livre, não havendo necessidade de se obter autorização ou pagamento pelo uso dela. De acordo com a legislação (artigo 41 da Lei de Direitos Autorais) os Direitos Patrimoniais do autor perduram por 70 anos contados a partir de 1° de janeiro do ano subsequente ao do seu falecimento, obedecida a ordem sucessória da lei civil. No caso do programa de computador, em que não há incidência dos Direitos Morais, a Lei do Software assegura (artigo 2º, parágrafo 2º) proteção por 50 anos contados a partir de 1º de janeiro do ano subsequente ao da sua publicação ou, na ausência desta, da criação do programa.

Nesse contexto, o Direito de Autor protege as obras; isto é, as criações de espírito expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível. A título exemplificativo, o artigo 7º da Lei de Direitos Autorais relaciona como obras protegidas:

  1. os textos de obras literárias, artísticas ou científicas;
  2. as conferências, alocuções, sermões e outras obras da mesma natureza;
  3. as obras dramáticas e dramático-musicais;
  4. as obras coreográficas e pantomímicas, cuja execução cênica se fixe por escrito ou por outra qualquer forma;
  5. as composições musicais, tenham ou não letra;
  6. as obras audiovisuais, sonorizadas ou não, inclusive as cinematográficas;
  7. as obras fotográficas e as produzidas por qualquer processo análogo ao da fotografia;
  8. as obras de desenho, pintura, gravura, escultura, litografia e arte cinética;
  9. as ilustrações, cartas geográficas e outras obras da mesma natureza;
  10. os projetos, esboços e obras plásticas concernentes à geografia, engenharia, topografia, arquitetura, paisagismo, cenografia e ciência;
  11. as adaptações, traduções e outras transformações de obras originais, apresentadas como criação intelectual nova;
  12. os programas de computador;
  13. as coletâneas ou compilações, antologias, enciclopédias, dicionários, bases de dados e outras obras, que, por sua seleção, organização ou disposição de seu conteúdo, constituam uma criação intelectual.

Por outro lado, o artigo 8º da Lei de Direitos Autorais elenca o que não é objeto de proteção por Direitos Autorais:

  1. as ideias, procedimentos normativos, sistemas, métodos, projetos ou conceitos matemáticos como tais;
  2. os esquemas, planos ou regras para realizar atos mentais, jogos ou negócios;
  3. os formulários em branco para serem preenchidos por qualquer tipo de informação, científica ou não, e suas instruções;
  4. os textos de tratados ou convenções, leis, decretos, regulamentos, decisões judiciais e demais atos oficiais;
  5. as informações de uso comum tais como calendários, agendas, cadastros ou legendas;
  6. os nomes e títulos isolados; e
  7. o aproveitamento industrial ou comercial das ideias contidas nas obras.

Destaca-se que a Lei de Direitos Autorais, em seu artigo 11, define que autor sempre será a pessoa física criadora da obra literária, artística ou científica e que a proteção concedida ao autor poderá aplicar-se às pessoas jurídicas nos casos previstos na Lei.

Quanto à utilização da obra protegida, esta possibilidade se encontra necessariamente vinculada à autorização prévia e expressa do autor. O artigo 29 da Lei de Direitos Autorais exemplifica as possíveis modalidades de utilização da obra:

  1. a reprodução parcial ou integral;
  2. a edição;
  3. a adaptação, o arranjo musical e quaisquer outras transformações;
  4. a tradução para qualquer idioma;
  5. a inclusão em fonograma ou produção audiovisual;
  6. a distribuição, quando não intrínseca ao contrato firmado pelo autor com terceiros para uso ou exploração da obra;
  7. a distribuição para oferta de obras ou produções mediante cabo, fibra ótica, satélite, ondas ou qualquer outro sistema que permita ao usuário realizar a seleção da obra ou produção para percebê-la em um tempo e lugar previamente determinados por quem formula a demanda, e nos casos em que o acesso às obras ou produções se faça por qualquer sistema que importe em pagamento pelo usuário;
  8. a utilização, direta ou indireta, da obra literária, artística ou científica, mediante: (a) representação, recitação ou declamação; (b) execução musical; (c) emprego de alto-falante ou de sistemas análogos; (d) radiodifusão sonora ou televisiva; (e) captação de transmissão de radiodifusão em locais de frequência coletiva; (f) sonorização ambiental; (g) a exibição audiovisual, cinematográfica ou por processo assemelhado; (h) emprego de satélites artificiais; (i) emprego de sistemas óticos, fios telefônicos ou não, cabos de qualquer tipo e meios de comunicação similares que venham a ser adotados; (j) exposição de obras de artes plásticas e figurativas;
  9. a inclusão em base de dados, o armazenamento em computador, a microfilmagem e as demais formas de arquivamento do gênero;
  10. quaisquer outras modalidades de utilização existentes ou que venham a ser inventadas.

O regime de proteção dos Direitos Autorais no Brasil assegura que as obras intelectuais estejam protegidas a partir do momento de sua criação, independentemente de registro. Não obstante, o artigo 19 da Lei de Direitos Autorais estabelece que é facultado ao autor registrar a sua obra no órgão público competente que, no caso do software é o Instituto Nacional da Propriedade Industrial – INPI e para as demais obras intelectuais, em geral, a Biblioteca Nacional. O registro, apesar de não ser obrigatório, é importante, pois serve como prova de anterioridade, em caso de discussão acerca da autoria da obra.

Todavia, mesmo o Direito de Autor comporta exceções. Nesse sentido, o artigo 46 da Lei de Direitos Autorais elenca os eventos que não constituem ofensa aos Direitos Autorais. Isso posto, não representam violações quando realizada:

  1. a reprodução: (a) na imprensa diária ou periódica, de notícia ou de artigo informativo, publicado em diários ou periódicos, com a menção do nome do autor, se assinados, e da publicação de onde foram transcritos; (b) em diários ou periódicos, de discursos pronunciados em reuniões públicas de qualquer natureza; (c) de retratos, ou de outra forma de representação da imagem, feitos sob encomenda, quando realizada pelo proprietário do objeto encomendado, não havendo a oposição da pessoa neles representada ou de seus herdeiros; (d) de obras literárias, artísticas ou científicas, para uso exclusivo de deficientes visuais, sempre que a reprodução, sem fins comerciais, seja feita mediante o sistema Braille ou outro procedimento em qualquer suporte para esses destinatários;
  2. a reprodução, em um só exemplar de pequenos trechos, para uso privado do copista, desde que feita por este, sem intuito de lucro;
  3. a citação em livros, jornais, revistas ou qualquer outro meio de comunicação, de passagens de qualquer obra, para fins de estudo, crítica ou polêmica, na medida justificada para o fim
  4. a atingir, indicando-se o nome do autor e a origem da obra;
    o apanhado de lições em estabelecimentos de ensino por aqueles a quem elas se dirigem, vedada sua publicação, integral ou parcial, sem autorização prévia e expressa de quem as ministrou;
  5. a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas, fonogramas e transmissão de rádio e televisão em estabelecimentos comerciais, exclusivamente para demonstração à clientela, desde que esses estabelecimentos comercializem os suportes ou equipamentos que permitam a sua utilização;
  6. a representação teatral e a execução musical, quando realizadas no recesso familiar ou, para fins exclusivamente didáticos, nos estabelecimentos de ensino, não havendo em qualquer caso intuito de lucro;
  7. a utilização de obras literárias, artísticas ou científicas para produzir prova judiciária ou administrativa;
  8. a reprodução, em quaisquer obras, de pequenos trechos de obras preexistentes, de qualquer natureza, ou de obra integral, quando de artes plásticas, sempre que a reprodução em si não seja o objetivo principal da obra nova e que não prejudique a exploração normal da obra reproduzida nem cause um prejuízo injustificado aos legítimos interesses dos autores.

Da mesma forma, o artigo 47 da Lei de Direitos Autorais dispõe que são livres as paráfrases e as paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária, nem lhe implicarem descrédito.

Frise-se que o artigo 4º da Lei de Direitos Autorais prevê a interpretação restritiva dos negócios jurídicos sobre os Direitos de Autor. Com isso, ainda que o titular do Direito Autoral tenha autorizado a reprodução da obra em um tipo de suporte físico, a sua reprodução em outro tipo de suporte ou, ainda, em versão digital, necessita de nova autorização expressa dele. Por isso é sempre particularmente importante que os contratos sejam o mais detalhado e abrangente possível quando se trata de definir a extensão da autorização para reprodução ou utilização de uma obra.

4.5.3. Consequências em caso de violação de direito autoral

O Direito brasileiro garante aos titulares dos direitos de propriedade intelectual, o uso exclusivo sobre suas criações, obras e invenções. Conforme mencionado, nenhum terceiro pode utilizar esses bens sem prévia e expressa autorização. Do contrário, pode estar sujeito a sanções legais.

Desse modo, em suma, em casos de violações de Direitos Autorais, o seu titular pode buscar a compensação dos danos sofridos, sejam eles materiais e/ou morais, com fundamento na Lei de Direitos Autorais (artigo 101 e seguintes), no Código Civil (direitos da personalidade), no Código Penal (artigo 184), dentre outras legislações nacionais e tratados internacionais aplicáveis a depender do caso concreto.


Autores: Rodrigo d’Avila Mariano e Daniela Favaretto 

Chiarottino e Nicoletti Advogados

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