Em 20.03.2020, o Senado Brasileiro aprovou, por sessão virtual inédita, o Decreto Legislativo (PDL) no 88/2020 , que reconheceu o estado de calamidade pública no Brasil até 31.12.2020, em razão da nova infecção global ocasionada pelo coronavírus (COVID-19), classificada como uma pandemia pela OMS.
Para o enfrentamento do estado de emergência de saúde pública ocasionado pelo referido vírus, o Governo Brasileiro regulamentou a Portaria MS no 356/2020 que estabelece diversas medidas de combate ao COVID-19, dentre elas, o isolamento social e o consequente fechamento de estabelecimentos não essenciais. Nesse momento crítico, foi a ação mais eficaz encontrada para tentar evitar a propagação e transmissão local do vírus e, com isso, inúmeras pessoas tiveram que cancelar ou adiar viagens, passeios e eventos.
Tais medidas trouxeram impactos visivelmente drásticos nos setores de turismo e aviação. No entanto, não são só as companhias aéreas, agências de viagens ou de eventos que precisarão lidar com essa situação, mas também os hotéis e agentes intermediadores de reservas, em razão das crescentes desistências e/ou impossibilidade de atendimento de reservas pelos próprios estabelecimentos.
Nesse contexto, algumas Prefeituras Municipais, como São Sebastião, Ilhabela e Ubatuba, cidades do litoral de São Paulo, suspenderam os alvarás de funcionamento de hotéis e pousadas ou restringiram as atividades dos setores e a entrada de pessoas para frear o turismo e o contágio do novo coronavírus . No entanto, a situação brasileira no combate ao vírus ainda é incerta e, caso a prevenção atual ainda não seja suficiente, as medidas de enfrentamento poderão ser mais incisivas.
Ainda que não haja medidas uniformes determinando o fechamento de hotéis em todo o Brasil, é certo que aqueles que tinham viagens marcadas tendem a solicitar — se é que já não solicitaram — seus cancelamentos para evitar ao máximo qualquer aglomeração ou possibilidade de contaminação, já que a transmissão do COVID-19 já é comunitária e se alastrou rapidamente.
É certo que os hotéis e diversos outros estabelecimentos sofrerão um impacto brutal nos seus faturamentos e a estimativa é que o volume de reservas cairá de 70% a 90% até o final de abril de 2020 , o que os estimulará a tomar providências para cativar os seus clientes e se reerguerem para o segundo semestre.
A divulgação de ações promocionais de marketing com pré-pagamento pelos consumidores é uma das formas que as redes hoteleiras e aplicativos de reserva têm encontrado para tentar dar a volta por cima. No entanto, é preciso ter consciência de que tais ações ainda são incertas, pois não há previsão exata do término da pandemia do COVID-19.
Suponhamos que determinado hotel divulgue promoções de 50% de desconto para reservas a serem realizadas a partir de julho de 2020, com condição de pré-pagamento pelos consumidores, ou seja, o consumidor já realiza o pagamento da sua diária neste mês e garante a sua hospedagem para agosto de 2020, por exemplo. E se em agosto de 2020 a pandemia persistir? Como ficarão as reservas e os prováveis novos pedidos de cancelamento?
Há em trâmite na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei no 613/20, de autoria do Deputado Luciano Ducci (PSB-PR), que assegura ao consumidor o direito de receber de volta, sem cobrança de taxas, o valor pago por serviço não utilizado de hospedagem em caso de pandemia decretada pela OMS ou, se preferir, receber um crédito no total do valor pago da viagem que deverá ser utilizado em até 24 (vinte e quatro) meses.
Até então, não havia qualquer norma especial que regulamentasse casos específicos como o surto de doenças, sendo válida a regra de que os consumidores podiam cancelar ou remarcar as suas reservas com direito ao reembolso do valor com algum deságio ou mediante o pagamento de taxa, considerando as aplicações das excludentes de responsabilidade por caso fortuito ou força maior, previstas no art. 393 do Código Civil.
Ocorre que, desde que a OMS decretou a pandemia, o PL no 613/20 já está surtindo efeitos mesmo sem a sua total aprovação, uma vez que diversas redes hoteleiras e agentes intermediadores já estão tomando as medidas previstas no projeto, quais sejam, o cancelamento sem custos ou a possibilidade de transformação do valor pago pela reserva em crédito, pois nesses casos, estamos falando de um caso fortuito, do qual o consumidor e o fornecedor do serviço de hospedagem não
deram causa e não devem ser prejudicados.
Dessa forma, é interessante que, enquanto perdurar a pandemia, os consumidores procurem as redes hoteleiras e aplicativos de intermediação de reservas para negociações, buscando a melhor saída para ambos, como a possibilidade de remarcação da reserva para outro período. Da parte das redes hoteleiras e intermediadores de reservas, é interessante que eles adicionem essas regras de força maior nas suas políticas de cancelamento para confortar e informar o consumidor, com clareza, de que ele não será prejudicado caso realize uma reserva para um futuro próximo, em razão das chamativas promoções, e queira cancelar, mesmo tendo conhecimento de que a pandemia do COVID-19 poderia perdurar.
De Vivo, Castro, Cunha, Ricca e Whitaker Advogados
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