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Eduardo Nunes de Carvalho
Quem teve oportunidade de passar por cidades como Indaiatuba-SP, Joinville-SC, Rio Novo do Sul-ES ou Nova Friburgo-RJ pode ter notado um elemento comum entre elas: elas receberam a imigração suíça. Ou seja, povos provenientes da confederação formada por 26 cantões e que hoje é listada entre as dez primeiras nações em PIB per capita e em IDH – índice de desenvolvimento humano. A primeira leva de imigrantes europeus a se fixarem no Brasil depois dos portugueses foi oficializada com o Decreto assinado pelo então Príncipe Regente Dom João VI em 16/5/1818 autorizando o Cantão de Friburgo a imigrar no Distrito de Cantagalo – Fazenda do Morro Queimado.
E como não perceber a presença de tão notável cultura? Em minha primeira ida a Indaiatuba, em uma época que os aplicativos GPS não eram tão comuns, era normal se obter dicas com conhecidos sobre como se chegar a um determinado local. Na época, foi me sugerido falar com o Sr. Wolf. Contatei-o por telefone e ele me passou as coordenadas. Chegando na cidade, fui trabalhar em um projeto numa indústria de autopeças, quando o Sr. Ambiel foi o coordenador responsável por me passar as informações de análises dos processos. Finalizado o expediente de trabalho, dirijo-me ao hotel no centro de Indaiatuba, onde visualizo no caminho corretora de seguro com a bandeira vermelha e uma cruz branca ao centro, loja de artigos importados com o sobrenome Ambiel, farmácias, estabelecimentos, restaurantes com sobrenomes Amstalden e outros, topônimos com referência à Helvetia, imobiliárias e firmas com nomes “estrangeiros” e assim por diante. A curiosidade bateu e não precisou de muita pesquisa para constatar que Indaiatuba recebeu desde 1888 a imigração suíça com as famílias Ambiel, Amstalden, Bannwart e Wolf. E como mudou a cidade! Basta observar os sinais de desenvolvimento local com escolas, igrejas, indústria e até campos para modalidades olímpicas como o tiro esportivo.
Um olhar mais dedicado na História do Brasil e se percebe como os suíços se mesclaram pacificamente ao caldeamento racial sul-americano e contribuíram em diversos campos nas artes, nas ciências, na economia e etc. Menciono como exemplos: Adolfo Lutz que foi o pai da medicina tropical e zoologia médica; Walter Smetak mestre da música (entusiasta da Eubiose – escola iniciática fundada pelo Professor Henrique José de Souza) que influenciou os trabalhos de Gilberto Gil e Caetano Veloso; Emílio Goeldi naturalista que revolucionou a zoologia agrícola e o Museu de História Natural do Pará – hoje Museu Emílio Goeldi; Juliana Knust e Heloísa Perissé atrizes; Ricardo Boechat jornalista; Clóvis Bornay carnavalesco; e vários outros notáveis.
Entretanto, os primeiros suíços a pisarem na América lusa foram jesuítas que muito contribuíram na educação, na evangelização de povos e na expansão territorial do país. No estudo “Vestígios Suíços na História do Brasil” de Carlos H. Oberacker Jr., vemos exemplos como Rennward Cysat que publicou livro em 1586 sobre a cristianização indígena (embora ele não tenha mencionado se esteve ou não na América), Jodocus Perret (padre Peres) que atuou no Pará e os padres Jodoco Bachmann, Karl Rechberg e Martinho Schmid que atuaram nas missões do Sul. Tanto empenho helvético que até uma colônia informal foi fundada em 1765 na colônia Vila Viçosa de Madre de Deus – Pará, mas que foi interrompida com a política do Marquês de Pombal que determinou a saída dos jesuítas da América Portuguesa.
Vejo que a vinculação atingiu níveis meta-históricos. O amarelo da bandeira do Brasil simboliza, desde os tempos de sua fase imperial, a Casa Real Habsburgo, a mais poderosa dinastia que na História do Brasil se viu presente tanto no período filipino entre 1580 e 1640, quando Espanha e Portugal estiveram unidos, quando no período de independência do país onde a Imperatriz Leopoldina exerceu papel crucial. Pois bem, a Casa Real Habsburgo nasceu no século XI no Cantão de Argóvia que fica justamente na Suíça!
Hoje vemos multinacionais contribuindo na economia com cerca de 22 bilhões de dólares (Nestlé, ABB, Roche, Novartis, MSC, Curaprox, Zurich Seguros e etc), convênios tecnológicos, eventos culturais, gastronômicos e intercâmbios frutíferos acontecendo. E após a exclusão da Suíça da lista de “paraísos fiscais” da Receita Federal Brasileira em 25/6/2010, negociações evoluíram e em 3/5/2018 membros do governo suíço e brasileiro firmaram acordo para se evitar a bitributação. Uma positiva parceria digna de celebração no ano do bicentenário da imigração suíça!