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“Brasil: perspectivas para o próximo governo e desafios de longo prazo”

29/ago/2018 - Economic Breakfast

Palestra ministrada por Paulo Miguel, sócio-diretor de investimentos e pesquisa econômica na GPS.

Paulo Miguel é sócio-diretor de investimentos e pesquisa econômica na GPS, empresa de gestão de patrimônio do grupo Julius Baer. Foi sócio e economista-chefe da Quest Investimentos entre 2005 e 2013. Professor de finanças internacionais e avaliação de empresas no INSPER/SP. É articulista econômico do jornal Folha de São Paulo e mestre em economia pela FEA-USP e MBA pelo INSEAD.

Por Karin Fuchs

Na manhã do dia 29 de agosto, na sede da Schalch Sociedade de Advogados, em São Paulo, a SWISSCAM, Câmara Suíça, promoveu um encontro com os seus associados, com a participação de Paulo Miguel, sócio-diretor de investimentos e pesquisa econômica da GPS, que apresentou a palestra “Brasil: perspectivas para o próximo governo e os desafios de longo prazo”.

Na abertura do encontro, Hélcio Shiguenori Takeda, sócio da Pezco, comentou que o Brasil está passando por um momento bastante conturbado na política e na economia. “E quanto maior o número de insights que tivermos, melhor será para nos planejarmos para os próximos anos. Nesse contexto, o Paulo Miguel nos dá a honra de nos passar uma impressão do que está acontecendo”.

Sócia da Schalch Sociedade de Advogados, Débora Schalch, falou sobre a parceria com SWISSCAM. “Ela tem sido uma grande parceira. E quando nos falaram sobre a ideia desse evento, de imediato abraçamos a ideia, pois sabemos da qualidade dos eventos e das palestras que ela promove. Para nós, é uma honra ter nos escolhido para realizar esse encontro”.

Na sequência, Paulo Miguel deu início à sua apresentação, dividida em três partes: conjuntura econômica, produtividade e contexto internacional. “Há uma oportunidade econômica muito rara no país, o juro baixo, a taxa Selic. E se as incertezas do endividamento forem resolvidas, eu arrisco a dizer que teremos o período mais extenso de juros nominais baixos da nossa história”, afirmou.

Crescimento econômico – A começar pela expectativa de crescimento do PIB, inicialmente de 3% para este ano, ele comentou que o cenário mudou. “Nós tivemos uma decepção no primeiro trimestre, e desde a greve dos caminhoneiros e quando as eleições entraram realmente na pauta, tudo ficou suspenso. Hoje, a expectativa é de um crescimento de 1,5% e não foram alteradas as previsões para 2019 e 2020, muito em função de qual será o resultados das eleições”.

Segundo ele, “a greve dos caminhoneiros acabou catalisando uma série de preocupações que estavam um pouco latentes, de certa forma foi um choque de realidade naquele momento, salientando também que o risco de polarização era maior do que o que estava sendo considerado”.

Situação atual – Baixas taxas de juros e de inflação mostram um quadro que se revela uma vantagem muito grande nesse ciclo econômico que estamos vivendo. “Pela primeira vez em muito tempo, nós temos uma inflação bastante confortável e que se a questão das contas públicas for resolvida há a chance de quebrarmos a espinha dorsal da inflação de serviços e talvez convergir para uma situação mais próxima do que temos internacionalmente”.

Ele lembrou que vários fatores que tiveram impacto inflacionário ao longo do tempo provocaram uma segmentação do mercado de juros, diferentemente dos dias atuais, em que há condições para que a inflação se mantenha baixa e, consequentemente, a taxa de juros também, por um período muito mais extenso do que o vivenciado em todos os ciclos econômicos, desde 1994.

Sobre a alta taxa de desemprego no país, disse ele: “ela se mantém alta. Hoje o subemprego ou a situação precária de emprego representam quase 27% do total da força de trabalho”. E comentou que o endividamento da família, também alto, tende a ter uma reversão, assim como uma alavancagem industrial em função do crédito corporativo, da política de expansão do BNDES. “Ainda há problemas de rentabilidade, custos financeiros ainda estão altos, mas o período mais crítico já ficou de certa forma para trás”.

Capitais – Por mais que haja uma especulação do câmbio, o que para Paulo Miguel é mais uma proteção que o mercado está buscando e não uma saída de capitais, o que não ocorreu, há uma “sobra” de financiamentos que permite até uma saída de capitais sem pressionar muito a taxa de câmbio. E exemplificou:

“No período de ouro de acúmulo de reservas nós chegamos a ter uma sobra de US$ 20 bilhões a US$ 30 bilhões por ano. Hoje temos uma sobra nunca vista de certa forma. Se a confiança voltar, nós teremos uma situação externa bastante confortável, que permite um ritmo de crescimento de retomada bastante acentuada, que poderá elevar o PIB a 3% a 4%, em 2019 e 2020”.

Gargalos – Na visão de Paulo Miguel, um dos principais deles é o déficit nominal (soma das receitas e despesas do Governo Federal), incluindo o pagamento de juros. “O déficit chegou a 10% do PIB, em 2015. Posteriormente, houve uma redução lenta, mas ainda há um movimento acelerado de dívida pública do governo. Para que de fato haja uma redução do déficit nominal é preciso fazer uma virada de 4% do PIB nas contas, o que significa mais ou menos R$ 250 bilhões em ajustes”.

O fato positivo é que, de acordo com Paulo Miguel, 2017 foi o melhor ano para o mercado de capitais e que ele já começa a responder à realidade de juros baixos. E defendeu que o ajuste fiscal é básico. “Condição necessária para perenizar a redução de juros e abrir uma oportunidade para o capital privado entrar no financiamento empresarial, especialmente na área de infraestrutura”.

Ajustes – Para Paulo Miguel, a Reforma da Previdência é fundamental, mas não apenas ela reduzirá o déficit público, o grande peso é a folha de pagamento do funcionalismo público. Em números, ele apresentou um estudo encomendado ao Banco Mundial, pelo ex-ministro da Fazenda, Joaquim Levy, intitulado “O ajuste justo”. “Pelo estudo, se salva 1,8% do PIB na previdência em um horizonte de dez anos. Porém, apenas os salários da força de trabalho no setor público no governo federal é 67% superior em relação ao que se indexa na iniciativa privada para cargos e funções. Uma diferença brutal”.

A boa notícia, afirmou ele, “há um diagnóstico de que há excesso de privilégios nos serviços públicos e nos subsídios, muito maior do que havia no passado. O ajuste das contas públicas é necessário para perenizar o custo de capital baixo. Essa agenda está posta. O quanto ela se manterá dependerá de quem vencer as eleições”.

Produtividade – Paulo Miguel defendeu que para aumentar a produtividade é preciso haver uma reversão no formato de tributação. A arrecadação deveria ser maior sobre a renda e a produtividade, a exemplo dos países que compõem a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico), do que sobre impostos diretos.

“Nós temos uma tributação de dez serviços em transações financeiras (PIS, Cofins, ICMS etc.), tudo isso representa 51% do total da arrecadação e a parte de renda e propriedade representa 33%. Nos padrões da OCDE, o peso da arrecadação direta é muito menor, tem países em que esse percentual é de 25%, e o peso muito mais significativo é na tributação de renda. No Brasil há uma inversão, o que é um empecilho para o setor privado se desenvolver”.

Segundo ele, “um ponto consensual entre os candidatos (a presidente da República) é caminhar para um regime que substitua toda essa parafernalha. É uma questão de recomposição e simplificação. E de caminharmos para uma tributação maior sobre a renda e reduzir o Imposto de Renda para pessoa jurídica. Também é preciso reduzir o Custo Brasil para os padrões internacionais, para alavancar a produtividade”.

Segurança jurídica – Também para aumentar a produtividade, ele citou a questão de segurança jurídica e de pagamentos de impostos. “Nas métricas de Doing Business, o Brasil está em uma posição vexaminosa, principalmente na questão de segurança jurídica e de pagamento de impostos. As empresas gastam, em média, 2.600 horas para cumprir as suas obrigações tributárias”, expôs, defendendo a importância da Reforma Tributária.

Tecnologia e mercado de trabalho – A introdução de tecnologias no setor produtivo, a chamada Indústria 4.0, tem gerado uma série de debates sobre o futuro dos empregos. “Nos países desenvolvidos é um desafio grande, pois o nível de educação é alto e a tecnologia pode ser destruidora de empregos. Nos países em desenvolvimento é o oposto, pois os setores que podem ter um grande crescimento são fortes geradores de empregos, como por exemplo no Brasil, na infraestrutura”, disse, citando um estudo da McKinsey sobre o tema.

Economia mundial – Com relação ao cenário internacional, Paulo Miguel analisou que “a economia mundial está muito boa. No início dos anos de 2014 a 2016 havia uma projeção que foi caindo, e nos últimos dois anos houve uma inversão dessa tendência. O crescimento da economia mundial tem surpreendido positivamente na maior parte das regiões, principalmente nos Estados Unidos. E esperamos que essa situação continue pelo menos até o próximo ano”.

O risco, avaliou ele, é a inconsistência adotada pelo governo de Donald Trump. “A inconsistência é um desemprego muito baixo, mas com corte de impostos e aumento de gastos. Para os mercados, a consequência é a redução da liquidez mundial. Começa haver perturbações no mercado financeiro, mais adversa do ponto de vista do financiamento de juros do Estados Unidos aumentando, o que pode gerar impactos mais significativos. Por isso, a urgências de ajustes no Brasil”.